CONHECENDO  O HELICOBACTER PYLORI

 

O Helicobacter pylori, também conhecido como H. pylori, é uma bactéria que ataca exclusivamente a mucosa gástrica dos seres humanos, sendo que algumas outras espécies de Helicobacter podem infectar outras espécies de animais. Grande parte das úlceras pépticas, certos tipos de gastrite e de câncer do estômago são causados por esse microrganismo, embora a maior parte dos indivíduos infectados nunca chegam a apresentar qualquer sintoma relacionado com a H. pylori. Essas bactérias são os únicos organismos conhecidamente capazes de sobreviver no meio ácido do estômago humano.
O gênero Helicobacter, juntamente com outros, forma a superfamília VI de bactérias gram-negativas. Quando observada à microscopia de luz e ótica, esta bactéria apresenta morfologia homogênea, espiralada, de superfície lisa e extremidades arredondadas, móvel, não-esporulada e microaerófila. Medem entre 0,5 µm a 0,1µm, e apresentam largura aproximada de 0,3 µm de comprimento, possuindo de quatro a seis flagelos unipolares.

IMAGEM DO HELICOBACTER PYLORI EM GRANDE AUMENTO

Atualmente são conhecidas, pelo menos, 27 espécies pertencentes a este gênero, que compartilham propriedades comuns. Estas bactérias podem estar presentes na mucosa gástrica de maneira focal, segmentar ou difusa, sendo encontradas no interior ou abaixo da camada de muco que reveste o epitélio da superfície ou criptas gástricas.
A H. pylori possui extraordinária habilidade de aderência. Como já foi dito anteriormente, esta bactéria coloniza apenas a mucosa gástrica, sendo eventualmente observada em regiões de metaplasia do intestino; no duodeno coloniza regiões de metaplasia gástrica, condição essencial para seu desempenho na patogênese da úlcera péptica duodenal.

HISTÓRIA DO HELICOBACTER PYLORI

No ano de 1875, pesquisadores alemães identificaram bactérias espirais na mucosa do estômago. Como esses microrganismos não cresceram in vitro, os achados foram esquecidos. Em 1892 um pesquisador italiano relatou a presença de bactérias no estômago de cães. Posteriormente, em 1899, um professor da Universidade de Jaguelônica, na Cracóvia, encontrou uma bactéria quando realizava uma investigação em sedimentos de lavagem gástrica, batizando-a de Vibrio rugula. Este foi o primeiro pesquisador a sugerir o provável papel dessa bactéria na patogênese de enfermidades gástricas.
Já em 1979, a bactéria voltou a ser estudada por um pesquisador autraliano Robin Warren, retornando suas pesquisas em 1981, juntamente com Barry Marshall. Estes pesquisadores isolaram a H. pylori da mucosa gástrica de humanos, obtendo sucesso em seu cultivo in vitro. Contudo, foi apenas em 1989 que esse microrganismo foi colocado em seu próprio grupo, Helicobacter. A descoberta do Helicobacter pylori por Robin Warren e Barry Marshall, representou um marco gigantesco para a ciência em geral e para a Medicina em particular, e por esta descoberta os seus autores foram homenageados com o Prêmio Nobel de Medicina e Fisiologia em 2005, por reescreverem a literatura científica no que se refere à causa de gastrites e úlceras gástricas e duodenais.

INCIDÊNCIA E PREVALÊNCIA

Esta bactéria está presente no mundo todo e, nos seres humanos, a gastrite induzida por ela é uma das infecções mais comuns, acometendo aproximadamente metade da população mundial. Embora não se conheça exatamente a forma de contaminação, estudos revelam que a infecção se instala habitualmente antes dos 10 anos de idade.
 Sua prevalência varia de acordo com o nível social, com a idade e etnia, sendo que estudos mostram que a infecção pela H. pylori é maior com o aumento da idade dos indivíduos, bem como é maior nos países em desenvolvimento
O H. pylori está presente em quase 70% da população brasileira, e não causa sintomas na maioria dos pacientes. Entretanto, pode causar gastrites, úlceras do estômago e duodeno, e mesmo câncer gástrico, especialmente em pacientes com infecção crônica por mais de 20 anos e com predisposição genética.
Responsável por 90% das úlceras de estômago e duodeno, a prevalência do H. pylori vem caindo lentamente no Brasil, e esta redução lenta ocorre pela lenta melhoria das condições de vida e saneamento da população.

Acredita-se que com a melhora das medidas de saúde pública, como a extensão do saneamento básico às populações mais carentes, ajudaria a diminuir consideravelmente a contaminação destes pacientes, com consequente diminuição das doenças causada pela bactéria.

INFECÇÃO E TRANSMISSÃO

Os mecanismos de transmissão normalmente geram muita polêmica. As vias oral-oral e fecal -oral aparentemente são as principais formas de transmissão. Alguns pesquisadores sugeriram que a água contaminada por fezes de indivíduos infectados compõe uma importante fonte de infecção. Recentemente, foi relatado que essa bactéria também pode ser transmitida por via oral-anal.
Alguns pesquisadores sugerem que, além das causas ambientais que contribuem para a infecção pela H. pylori, determinados fatores do hospedeiro (estes ainda desconhecidos) desempenham um considerável papel nas taxas de infecção e nos resultados patológicos provocados pela bactéria.
A primeira e de vital importância é a resistência ao ácido clorídrico, o que confere à bactéria proteção contra os efeitos deletérios do ácido pH estomacal. Para colonizar a mucosa gástrica, a bactéria necessita atravessar a barreira de muco responsável por proteger o epitélio gástrico. Lipases produzidas pela H. pylori degradam essa camada de muco, tornando mais fácil a penetração da bactéria. Além disso, há também sua estrutura espiral, o que confere a essas bactérias ágil movimentação, transpondo a camada de muco, instaurando íntimo contato com as células epiteliais que revestem o estômago. Outras enzimas sintetizadas pela H. pylori, concedem proteção contra a ação das células de defesa, impossibilitando uma resposta eficaz do hospedeiro.
A alteração histológica mais visível na mucosa gástrica é a resposta inflamatória, podendo resultar em carcinogênese gástrica por levar a danos no DNA das células.

DIAGNÓSTICO

Existem diversas maneiras de descobrir a infecção por esse microrganismo.
O “padrão ouro” para o diagnóstico do Helicobacter pylori é a endoscopia digestiva, onde o médico pode remover um pequeno fragmento da parede do estômago e mandar para um patologista para que este pesquise a presença da bactéria. Existe também um teste respiratório de fácil realização que não necessita de endoscopia. Pode também ser feita a pesquisa por anticorpos anti-Helicobacter pylori no sangue, sendo este um exame recomendado para saber se já houve a infecção pela bactéria, pois os anticorpos permanecem cerca de 1 ano positivos após a erradicação da bactéria.

SINTOMAS

A imensa maioria dos pacientes contaminados pelo H. pylori, não apresenta qualquer sintoma ou complicação.
Quando os pacientes contaminados apresentam queixas, elas provavelmente se devem às doenças causadas pela bactéria, como gastrites e úlceras.
Nestes casos, os sintomas mais frequentes são:

– Dor ou desconforto, tipo “queimação” na parte superior do abdômen;

-Saciedade precoce, após comer apenas uma pequena quantidade de alimentos;

-Sensação de plenitude gástrica.

No caso de úlceras gástricas ou duodenais, além dos sintomas acima podem ocorrer:

-Náuseas e/ou vômitos;

-Fezes escuras;

-Anemia por carência de ferro.

HELICOBACTER PYLORI E O CANCER GÁSTRICO

Embora a Agência Internacional de Pesquisa em Câncer (IARC) da Organização Mundial as Saúde (OMS) tenha classificado o Helicobacter pylori como “Carcinógeno Classe I” para o câncer gástrico, na mesma categoria que o tabagismo para o câncer de pulmão e trato respiratório e os vírus C e B para o câncer de fígado, o tratamento da bactéria não está indicado a todos os pacientes assintomáticos contaminados, uma vez que o câncer gástrico só irá se manifestar num pequeno número de pacientes em relação ao número de contaminados, ou seja, pacientes com predisposição genética e infecção crônica por mais de 20 a 30 anos.

Entretanto, pacientes contaminados pelo H.pylori, mesmo sem nenhum sintoma, com história famílias de câncer gástrico, devem ser tratados.

 O Helicobacter pylori tem uma relação direta com o aparecimento de um tipo específico de câncer gástrico, o Linfoma MALT, sigla em inglês para Tecido Linfóide Associado à Mucosa. Esta relação é tão direta que, muitas vezes, a erradicação da bactéria com antibióticos, pode levar à cura do tumos.

TRATAMENTO

As principais indicações para o tratamento do Helicobacter pylori são:

-Gastrite;

-Úlcera duodenal;

-Úlcera gástrica;

-Pacientes com cirurgia gástrica prévia;

-Pacientes com parentes em primeiro grau com câncer gástrico;

-Pacientes por carência de ferro sem causa aparente;

-Pacientes em tratamento de longo prazo com anti-inflamatórios não esteroides (AINES) e Ácido Acetil Salicílico (AAS);
-Pacientes com Púrpura Trombocitopênica Idiopática.
O tratamento, quando indicado, deve sempre ministrado pelo médico assistente, e individualizado para cada paciente, evitando-se o uso da automedicação.
O mercado farmacêutico disponibiliza tratamentos que proporcionam índices de cura de 85 a 90 % com um único ciclo de tratamento, através da associação de dois antibióticos e um inibidos da bomba de prótons (IBP).

AVALIAÇÃO PÓS TRATAMENTO

Após o tratamento para erradicação do Helicobacter pylori, deve ser feita a avaliação da efetividade do tratamento por métodos não invasivos, como o teste respiratótio.
Se o teste respiratório não estiver disponível, o teste de antígeno fecal é o método não invasivo de escolha tanto para o diagnóstico quanto para a confirmação da erradicação do H. pylori , desde que o anticorpo monoclonal seja usado.Se nenhum dos métodos não invasivos estiver disponível, pode ser realizada nova endoscopia com biópsias para a avaliação da cicatrização de eventuais lesões e da erradicação da bactéria.
Qualquer dos métodos de avaliação só deve ser realizado após, pelo menos 30 dias de suspensão do tratamento com antibióticos e inibidores da bomba de próton (IBP)

 

Dr. Milton S Zuckermann
Endoscopista e Colonospopista
Membro Titular da SOBED (sociedade Brasileira de Endoscopia Digestiva)